Reconstruindo Caminhos

Reconstruindo Caminhos
Escrevo porque chove saudades no terreno das minhas lembranças e na escrita eu deságuo as minhas urgências, curo velhas feridas e engano o relógio das horas trazendo o passado para brincar de aqui e agora... Costumo dizer que no calçadão da minha memória há sempre uma saudade de prontidão à espreita de que a linguagem da emoção faça barulho dentro de mim e que, nessa hora, o sal das minhas lágrimas aumente o brilho do meu olhar e uma inquietação ponha em desalinho o baú de onde emergem as minhas lembranças, para que eu possa, finalmente, render-me à folha de papel em branco...

junho 13, 2008

As ruas dentro de mim






As ruas da minha cidade caminham dentro de mim e por elas passeiam a menina-moça que eu fui um dia. Hoje, ao percorrer a passos largos de saudades por essas mesmas vias de outrora, me vejo - num olhar de doce contemplação - a procurar personagens que fazem parte desse meu trajeto pelas ruas da cidade.

Tudo continua igual, nada nem ninguém mudou de endereço.
Nenhum caminhão de mudança à vista...
Por que será, então, que só eu faço parte desse cenário? Um silêncio cala o barulho que vem de fora e eu sinto nesse momento que os meus sentidos se aguçam, reproduzindo sons e trazendo aromas, que fazem aflorar através das minhas lembranças, os passos que me conduzem a esse mesmo lugar e a fragrância do jasmim que perfumam as ruas da minha cidade.

Abro a janela da minha alma e a imaginação corre solta: ruas, avenidas e praças contornam os meus sonhos de menina. Aqui, a Festa das Neves se manifesta através do som alegre dos seus parques de diversões, da alegria criança dos seus meninos com o cheiro do cachorro-quente, do espetinho de carne e da maçã do amor. Lá nas Avenidas dos Ipês Amarelos, onde a poesia e o poeta marcaram um encontro de amor, alguma lágrima furtiva ficou esquecida a banhar as folhas que caem, marcas de um tempo e de saudades, ainda, em flor. Folhas ao vento espalham-se, cobrindo ruas, dobrando esquinas e deixando nua a minha alma, que caminha hoje solitária, pelas ruas dentro de mim.


Na praça, sentado em um banco qualquer, eu encontro o poeta – único personagem resgatado nessas minhas andanças – trazendo em suas mãos um amontoado de sonhos, em folhas de outono, que se dispersam pelos chãos: é um viajante que corre em busca do tempo perdido; é um encontro que foi desfeito e uma saudade que foi esquecida. E, finalmente, é o vento que varre as ruas, hoje quase nuas, e os espelhos d’água, provocados pelas lágrimas minhas e suas.