Reconstruindo Caminhos

Reconstruindo Caminhos
Escrevo porque chove saudades no terreno das minhas lembranças e na escrita eu deságuo as minhas urgências, curo velhas feridas e engano o relógio das horas trazendo o passado para brincar de aqui e agora... Costumo dizer que no calçadão da minha memória há sempre uma saudade de prontidão à espreita de que a linguagem da emoção faça barulho dentro de mim e que, nessa hora, o sal das minhas lágrimas aumente o brilho do meu olhar e uma inquietação ponha em desalinho o baú de onde emergem as minhas lembranças, para que eu possa, finalmente, render-me à folha de papel em branco...

fevereiro 09, 2015

Ilusão

















Ele sempre pedia: escreva! escreva! E eu, tonta, me despia em letras. Achava lindo aquele jeito de amar, até descobri que dentro dele havia um iceberg e que o dicionário do meu amor era labareda que não o aquecia. Ele tinha fome de palavras, mas o deserto da solidão que havia atravessado durante tanto tempo o incapacitara para os gestos longos e abraços demorados que as orações sugeriam.

Por isso, andei costurando as minhas palavras. Coloquei uma vírgula aqui, uma interrogação ali, as reticências pelo meio e, de súbito, uma interjeição que surgiu para clarear o caminho. Então, eu entendi, finalmente, que estava na hora de botar um ponto final naquela história de amor que nunca aconteceu... Ilusão!


fevereiro 01, 2015

Quando o Amor Salva















Sempre gostei de brincar com as palavras... Quando criança, um livro ou uma porção de letrinhas de plástico coloridas, nas mãos, fazia-me a festa. A imaginação fértil aliada a uma timidez cada vez maior levava-me, como um pássaro em voo rasante, a procurar abrigo nas páginas dos livros infantis e a manusear aquelas letrinhas de tal forma que o meu mundo pudesse ser composto só de amor, beleza e harmonia. Passava horas, encantada, pegando carona nas folhas de papel e transportando-me para um mundo de fantasias. Sem certezas geográficas me descobria um andarilho na terra dos sonhos... Mas, o tempo transcorreu rapidamente e os ponteiros do relógio arrancaram-me, sem dó nem piedade, do meu mundo ideal... Cresci!

Hoje, longe da altura fértil da minha imaginação, pergunto-me: - o que mudou de lá para cá? Onde está a menina tímida e sonhadora que eu fui e em que páginas do livro da vida se esconde? Respondendo com sinceridade posso dizer que ela continua aqui - dentro. Nada, em mim, mudou... Com as letras do alfabeto eu ainda crio um mundo possível, habitável, belo e harmonioso. Com elas construo palavras e derrubo muros e castelos de indiferença, fazendo aos outros aquilo que gostaria que fizessem a mim. Tudo o que desejo de bom me faz sair do casulo em que me escondo para ir ao encontro do outro e, juntos, diminuir a distância, a dor e a solidão do abandono... E isso, eu aprendi nos livros que li e na vivência com pessoas especiais que cruzaram o meu caminho... Ao longo dos anos, nenhuma coleção de dores nem de fracassos, mudou a minha essência... Não nasci para ser exceção, quero ser regra. Quero deixar marcas do bem por onde passar.

Por isso, agora, quando a vida me surpreende com uma dor mais funda e exige-me uma coragem e fé que eu não acreditava possuir, pergunto-me: o que é que essa dor está querendo me ensinar? Em que recantos de mim buscar essa força para não sucumbir?

Então, recorro a minha memória afetiva e lembro-me das letrinhas coloridas nas mãos, das histórias infantis que li e de pessoas especiais que cruzaram o meu caminho. Com elas eu construí um mundo: bom, ético, solidário e harmonioso. Com elas eu descobri que só o amor salva... Cura! Amor, essa energia amorosa, a única capaz de me tirar do casulo do medo e da angustia de não saber como será o dia seguinte (quando se está numa UTI) e agradecer a vida por mais essa oportunidade de aprender, mesmo através da dor, a me transformar numa pessoa melhor. Obrigada a todos pelo carinho, pela amizade, pelas orações e, principalmente, por me fazer acreditar que o melhor do ser humano ainda está dentro dele.