Reconstruindo Caminhos

Reconstruindo Caminhos
Escrevo porque chove saudades no terreno das minhas lembranças e na escrita eu deságuo as minhas urgências, curo velhas feridas e engano o relógio das horas trazendo o passado para brincar de aqui e agora... Costumo dizer que no calçadão da minha memória há sempre uma saudade de prontidão à espreita de que a linguagem da emoção faça barulho dentro de mim e que, nessa hora, o sal das minhas lágrimas aumente o brilho do meu olhar e uma inquietação ponha em desalinho o baú de onde emergem as minhas lembranças, para que eu possa, finalmente, render-me à folha de papel em branco...

abril 16, 2010

Licença Para Sentir Saudades








Pelas frestas da memória visito o meu estoque de recordações, faço um inventário das minhas saudades e penso: construir-me é um processo difícil e doloroso, pois a vida e as suas urgências tentam me ensinar a abrir mão de pessoas, coisas e lugares e eu não consigo.

Já faz algum tempo que, intimada pelo carinho dos meus filhos, resolvi fazer uma faxina em meus porões. Lá, encontrei um baú repleto de lembranças que me expôs o que chamo de minha pátria de intimidades. Nessa ocasião, remexendo em velhas fotografias, cartas de amor e pedaços de carinhos, pensei: na minha vida ninguém está de passagem e, por isso, em meus afetos também não há prazos de validade.

Como posso esquecer as pessoas que partiram encantadas pelo brilho das estrelas? E as outras que, acreditando nas promessas do porvir, permaneceram ao meu lado desafiando o tempo da esperança?

Como deixar de ouvir palavras alinhavadas em ternuras - antecipando carinhos - e sentir cheiros que ficaram guardados no sítio da memória?

Como não revisitar lugares que remetem a uma alegria escancarada, se em todas as minhas lembranças há sempre um rastro de felicidade?

Por tudo isso, parece que o meu destino é não aprender a dizer adeus, pois no enredo da minha vida não há um alvará de soltura para a saudade.

abril 06, 2010

Sessenta Anos







Preciso de tempo para desenrolar o novelo da vida, pois, no passado, gastei-o com coisas de somenos importância e agora ele me foge feito areia entre os dedos. É a ampulheta passando velozmente a cobrar as horas que me restam.

Este mês eu completo sessenta anos. Fisicamente, não coloquei silicone nem fiz retoques. Só na alma! Aqui onde as coisas realmente acontecem, eu fiz uma plástica. A minha está uma criança! Ávida por mudanças e com sede de conhecimento, ela passeia por caminhos onde a juventude, a pressa e o anseio por liberdade não pisaram. Os meus olhos outrora inquietos e o meu desejo febril, hoje, repousam na imensidão do mar, nas noites enluaradas e nas folhas de outono que caem lembrando que é tempo de renovação.

Sessenta anos e há pouco o que comemorar, pois a vida, de verdade, começa agora. Antes, era só um trailer! Pena que as horas sejam tão escassas para a criança, a jovem e a mulher que acordaram em mim. Uma trindade cheia de desejos e conquistas a realizar... Um trio cheio de boas intenções para se lançar ao desafio de viver sem mágoas, rancores e preconceitos de toda e qualquer natureza.

Preciso de um pouco mais de tempo para ousar o que ainda não fiz, mas ele se nega, zomba das minhas vontades, brinca com as minhas certezas e quando me dou conta, está partindo sem que eu possa lhe dizer o tanto que aprendi. Digo-lhe apenas que, hoje, é a época certa para fazer uma nova semeadura, mas ele desdenha e diz: - agora é tarde! E eu penso: Ah! Se soubesse do meu desejo por mudanças e quanto entusiasmo eu ainda tenho, talvez concedesse em atrasar os ponteiros do relógio só para me dar uma nova chance! Outra oportunidade para mudar as regras e virar o jogo da vida, que sempre começa quando está terminando...

Este mês eu completo sessenta anos, mas aqui dentro, onde as coisas realmente acontecem, estou nascendo agora. Plena de maturidade e querendo pôr em prática todas as lições que aprendi.