Reconstruindo Caminhos

Reconstruindo Caminhos
Escrevo porque chove saudades no terreno das minhas lembranças e na escrita eu deságuo as minhas urgências, curo velhas feridas e engano o relógio das horas trazendo o passado para brincar de aqui e agora... Costumo dizer que no calçadão da minha memória há sempre uma saudade de prontidão à espreita de que a linguagem da emoção faça barulho dentro de mim e que, nessa hora, o sal das minhas lágrimas aumente o brilho do meu olhar e uma inquietação ponha em desalinho o baú de onde emergem as minhas lembranças, para que eu possa, finalmente, render-me à folha de papel em branco...

julho 18, 2023

O Amor é Construção

 











Amar é apagar da memória os nossos excessos e reeducar o olhar para deixar o tempo abrir-se em direção ao outro. Amar é virar a página e se reinventar. É adiar certezas para um tempo futuro, quando os nossos olhos inventarem caminhos por onde o medo nos faz resistir. Todavia, quantos de nós somos capazes de retirar as cercas que colocamos ao nosso redor, para nos proteger da ameaça que é o outro no exercício da convivência?

O título desta prosa é: O Amor é Construção. Pois bem, o que será que temos a dizer sobre isto?

- Diremos que temos um olhar de esperança e de amorosidade no início de qualquer tipo de relacionamento. Naquele instante, em que somos cordialmente convidados a edificar a casa do amor, temos o mundo em nossas mãos. Um mundo de promessas onde esperamos, ingenuamente, que a tristeza e a dor não sejam revisitadas.

Passado algum tempo, um olhar de impaciência acusa-nos de que o outro, agora, é um território estranho. Então, nos recolhemos e achamos por bem voltar à zona de conforto da nossa eterna solidão. Um lugar onde ninguém nos confronta, afronta ou obriga-nos a rever as nossas verdades pétreas. E, desse modo, a vida vai esmaecendo a tal ponto que os dias vão acordando tristes e sombrios.

O que será que mudou? De quem foi a culpa? Por que aquele amor que se derramava através da janela do nosso olhar, denunciando um brilho intenso e uma alegria incontida, de repente, esmaeceu?

- Nada mudou! O amor é uma arte, uma construção diária que flerta com a eternidade. Todos nós sonhamos que ele dure para sempre e, a despeito do que disse o poeta Vinícius de Moraes, em seu poema Soneto de Fidelidade: “que seja infinito, enquanto dure”, nós ainda esperamos, dia após dia, que o brilho dos nossos olhos nunca se apague.

- De quem foi a culpa pelo fim do relacionamento?

- De todos e de ninguém em especial! Quando o sentimento acaba, todos perdemos. Perdemos a melhor parte de nós mesmos, porque o amor agrega e reúne em um só lugar, no coração, as nossas melhores intenções. Quando amamos somos mais benevolentes, solidários, empáticos e dispostos a contribuir para um mundo melhor. O poder inquestionável do amor nos faz melhores!

Por que, então, passado algum tempo, temos este olhar de impaciência para com o outro e deixamos que os dias sigam tristes e sombrios?

- São tantas as variáveis! No entanto, ousaríamos dizer que a principal, talvez, seja o ego de quem se julga melhor, mais sábio ou maior do que os outros. Há pessoas que vêm ao mundo com o dedo em riste, travestidas de juízes da humanidade e cheias de certezas pétreas. A essas, não lhe interessam ouvir opiniões contrárias, nem argumentos que derrubem convicções armazenadas em seu HD pessoal. São adultos infantilizados, incapazes de manter um diálogo cordial, quando percebem que terão de rever alguns pensamentos, ideias e posicionamentos.

Em razão disso, se em algum momento tiverem que optar, vão preferir o deserto da solidão à riqueza e o aprendizado que existe na convivência com o outro. Pois, afinal, o amor é uma construção diária erguida sobre o altar das nossas convicções e cabe a nós darmos a ele a chance de nos reinventar.