Entre o discurso e a realidade existe uma questão de dignidade e de respeito às diferenças...
Dentre os temas polêmicos, talvez o casamento homoafetivo seja o que mais cause estranheza, tendo em vista que não há legislação pertinente sobre tal matéria nem, tampouco, fundamentos que justifiquem – sob o ponto de vista cristão - a união entre pessoas do mesmo sexo.
Em que pese às razões alegadas de que as normas que regem o casamento só foram previstas em função da união entre um homem e uma mulher, é mister se reconhecer que a homossexualidade existe desde os primórdios da história da humanidade e que negar isso é resvalar pela hipocrisia e ignorância.
Diante de tal fato, se faz necessário a regulamentação em lei, que dê amparo e proteja o direito do cidadão, que opta em assumir o seu desejo, como um manifesto da sua liberdade de escolha. Escolha essa assegurada pela nossa Constituição, quando escreve em suas páginas a consagração dos princípios da liberdade e da igualdade de direitos.
Partindo da idéia do respeito à dignidade humana, podemos invocar por mudanças que tire dos guetos da vida quem exerce o mais elementar dos direitos que é o da liberdade.
Embora exista, por parte das religiões, resistência e certo prurido quando o assunto casamento entre iguais é ventilado, não podemos aceitar - sob pena de sermos levianos - o argumento de que a união entre as pessoas só se justifica por meio da procriação. É contraditória tal afirmação, uma vez que vai de encontro às celebrações que vemos, diariamente, entre casais de meia idade ou de jovens, onde a gravidez não é possível nem desejada.
Por outro lado, o que é o casamento senão a união de duas pessoas empenhadas em construir uma vida de respeito, amor, carinho?
Filhos! Sim, conseqüência desse afeto e desse querer só assim serão bem-vindos, amados e respeitados, mas não como imposição para realização do matrimonio, pois, se fosse dessa maneira, não teríamos clínicas psiquiátricas ou psicológicas para dar vazão a tanta demanda (...).
É indiscutível que esse assunto merece ser debatido a exaustão para que não reste a sociedade nenhum ranço que a impeça de sentir que os ventos da evolução, que nos fazem bem em outras áreas, também sejam bem-vindos no que concerne a união entre iguais.
Negar isso às pessoas que lutam por um ideal de justiça, que prime pelo respeito e pela igualdade para todos, é ignorar que a liberdade é o maior patrimônio de uma sociedade que se diz civilizada. Desconhecer o direito do cidadão de ser, sentir e vivenciar outra realidade que não a manifesta pelos padrões, ditos normais, é tirá-lo do seio da sociedade e transferi-lo para os guetos da vida, marginalizando-o. É retroceder no tempo, ignorar as mudanças e os novos códigos de conduta que exige de nós o respeito pelas diferenças.
Ainda que a relação entre pessoas do mesmo sexo nos cause estranhamento, precisamos buscar nas raízes desse comportamento o preconceito que nos leva ao discurso homofóbico e que tanto contribui para a segregação e a infelicidade dos nossos semelhantes. Pois, repito, entre o discurso e a realidade existe uma questão de dignidade e de respeito às diferenças...