Reconstruindo Caminhos

Reconstruindo Caminhos
Escrevo porque chove saudades no terreno das minhas lembranças e na escrita eu deságuo as minhas urgências, curo velhas feridas e engano o relógio das horas trazendo o passado para brincar de aqui e agora... Costumo dizer que no calçadão da minha memória há sempre uma saudade de prontidão à espreita de que a linguagem da emoção faça barulho dentro de mim e que, nessa hora, o sal das minhas lágrimas aumente o brilho do meu olhar e uma inquietação ponha em desalinho o baú de onde emergem as minhas lembranças, para que eu possa, finalmente, render-me à folha de papel em branco...

janeiro 20, 2012

Entre Números e Sonhos



Há um tempo que passa e, esse conta-se em números – é a juventude do corpo, que tem pressa porque vive aprisionado na ilusão dos dias... Há outro que também passa, mas esse conta-se em sonhos - é a maturidade da alma! É quando a bênção da idade madura põe fim à ansiedade, à urgência e nos liberta da censura e da escravidão dos números, fazendo-nos menos exigentes, mais reflexivos, pacientes, sábios e sonhadores.
Hoje, enquanto a passagem dos anos faz marcas em meu corpo e acrescenta-lhe um algarismo, desejo, razão e sensibilidade juntam-se harmoniosamente, para que a minha alma engatinhe no mundo livre dos sonhos. Nessa hora, eu faço um brinde à sua independência e vontade de ser feliz: sem amarras!
O meu olhar, a partir desse momento, passeia pelos dias absorvendo tudo ao redor. Nada escapa a minha retina... O brilho das estrelas não é apenas luminosidade, é festa para os meus olhos e o clic da máquina fotográfica não capta apenas o instante, ele registra a eternidade para a qual eu estou prestes a dar as minhas despedidas. Então, tudo passa a ter um sentido e um peso diferente. Aí, eu penso na minha juventude e relembro.
- No meu passado, tudo era motivo de frustração: fiquei infeliz porque perdi uma viagem, um emprego, um “grande amor”; fiquei triste porque rompi com o meu melhor amigo, mudei de endereço, de planos; e, entre outras coisas, fiquei depressivo porque não suportei o peso do adeus definitivo, o ser diferente e não saber partilhar a minha solidão. Orgulho, vaidade, soberba e poder foram heranças da minha juventude. E, agora, razão e sensibilidade são testemunhas da minha melhor idade.
Pouco importa, atualmente, se o vizinho tem uma casa, um carro ou um emprego melhor que o meu. Se a fibra do meu cabelo, a cor da minha pele ou a minha orientação sexual fizer a festa para os desocupados de plantão. Nem se deixo de sair nas colunas dos dez mais – ricos e famosos – tampouco se o meu português ruim impedir-me de sentar à mesa do chá das cinco...
Rótulos e etiquetas!? Estou dispensando, hoje, em nome da liberdade de ser feliz comigo mesma, pois tenho, dentro dessa alma que engatinha, – apesar dos anos - um manancial de amor, ternura e carinho que não envelhecem, nem se contam pelo uso.
Por isso, enquanto a minha alma caminha por entre números, eu festejo a sua maturidade brindando à vida, aos sonhos, ao fim das urgências e ao tempo que passa trazendo leveza, quietude, mansidão e sabedoria.