
Escreva em 20 ou até 25 linhas sobre o tema: enquadrar-se. Essa é a proposta do professor de redação em sala de aula.
De imediato, reflito: não consigo, pois o que penso e o que sou é a antítese do que ele me pede. Não me enquadro nem nas linhas, nem no tema. Pra falar a verdade, eu me desenquadro no geral...
Vivo à margem de qualquer conceituação do que seja moderno, principalmente, se isso faz referência ao amor. Este sentimento que hoje é colocado nos balcões da vida como mercadoria e que compra quem tem mais dinheiro, status ou poder.
Para enquadrar-me nos moldes atuais, eu teria que abrir mão da minha individualidade... Desconstruir-me. Negar a matéria dos meus sonhos e esse amor tão antigo, que aprendi a amar, amando.
Para enquadrar-me nos moldes atuais, eu teria que abrir mão da minha individualidade... Desconstruir-me. Negar a matéria dos meus sonhos e esse amor tão antigo, que aprendi a amar, amando.
Tudo o que sei sobre esse sentimento é inegociável, sobretudo, porque a moeda pelo qual ele foi adquirido saiu de circulação. Paguei por ele o preço da admiração, do respeito, da compreensão, da tolerância e do perdão. Sentimentos e palavras em desuso, mas que humanizam e que na realidade estamos sempre a cobrar do outro como se fôssemos perfeitos.
Para enquadrar-me eu teria que abrir mão ainda de detalhes que enriquecem as minhas histórias de amor e que guardo nas gavetas da memória como jóias raras... Para alguns são miudezas, bugigangas e quinquilharias que nada acrescentam, mas para mim são como brilhantes que reluzem e dos quais eu não abro mão, nem os trocaria por todo dinheiro do mundo.
São bens e atitudes de valores inestimáveis, entre outros: uma pequena flor colhida no mato, um conjunto de ferramentas para cuidar do jardim, uma tesoura para cortar o frango e uma pequena caneca para tomar café. Presentes que me foram dados por pessoas que cumpriram à risca o manual do bom amor: aquele que se importa com o outro, que sente a necessidade e se antecipa e, principalmente, aquele que se dispõe a gastar o seu tempo, para acender uma fogueira e ouvir a pessoa amada até a queima do último carvão.
Alguns dirão: - Que simplório! Quanto romantismo fora de época!
Ao que eu respondo: - é por isso que eu não me enquadro! Nem nas linhas, nem no tema. Sou adepta dos valores, das atitudes e dos amores antigos... Anacrônicos. E, além disso, já deixei por escrito que ao morrer, quero ser cremada e que as minhas cinzas sejam espalhadas por todos os lugares: calçadas, ruas e praças por onde andei de mãos dadas com os amores da minha vida. Lugares que contam um pouco da minha história. Uma história que venceu o tempo e que tem um sentimento com gosto de eternidade.
Por tudo isso, decididamente, eu não me enquadro nesse pós-modernismo que a tudo comercializa até mesmo o amor, transformando sentimentos, valores e pessoas em marionetes a serviço da propaganda, do consumo e da vaidade exacerbadas.
Sou uma moldura antiga... Uma peça que se desenquadra em 61 linhas e que está fora de uso... Démodé!