Reconstruindo Caminhos

Reconstruindo Caminhos
Escrevo porque chove saudades no terreno das minhas lembranças e na escrita eu deságuo as minhas urgências, curo velhas feridas e engano o relógio das horas trazendo o passado para brincar de aqui e agora... Costumo dizer que no calçadão da minha memória há sempre uma saudade de prontidão à espreita de que a linguagem da emoção faça barulho dentro de mim e que, nessa hora, o sal das minhas lágrimas aumente o brilho do meu olhar e uma inquietação ponha em desalinho o baú de onde emergem as minhas lembranças, para que eu possa, finalmente, render-me à folha de papel em branco...

junho 07, 2011

A Última Carta de Amor



O meu amor é feito de silêncios, engolindo as palavras e longe dos olhos que lendo não veem...
Ainda há tanto de ti dentro de mim que, embora eu corte as palavras, encerre os parágrafos e não deixe transparecer o fingir, continuo com esse sentimento doído e em carne viva. Foi dessa forma que comecei a te escrever, porém, num átimo de segundo, recuperei a lucidez e iniciei a minha última carta de amor, assim:

- Houve uma época em que eu não cabia dentro de mim. A tua ausência ocupava todo o meu espaço... Foram dias difíceis, de olhares líquidos e avarandados à espera de uma resposta... Pelos meus olhos derramavam-se as lembranças de nós dois. Saudade deixou de ser um sentimento abstrato e transformou-se em carne viva; tudo doía, o corpo e a alma. Em meu cérebro martelavam perguntas para as quais não tinha respostas: onde foi que eu errei? O que fiz ou deixei de fazer, no passado, de mais ou de menos? Como reconstruir esse caminho – depois de tanto tempo - e reescrever essa história, para ela dá certo, se os sentimentos e os personagens são os mesmos? Foram anos de silêncio, engolindo as palavras e a minha fome da tua presença...

Nesse entremeio, pessoas certas, na hora errada, cruzaram o meu caminho e desejaram esse amor de tanta entrega... Tão honesto e tão teu! Mas o meu coração de menina ainda habitava a casa da esperança. É verdade que o amor doía, pela tua ausência, porém, as boas lembranças e a possibilidade de conviver contigo – novamente - transformavam aquela dor num tempo de confiança onde a lucidez era esquecida.

Passaram-se tantos anos de olhares líquidos e avarandados a tua espera e de uma resposta, para aquela penúltima carta de amor que, hoje, pergunto-me: por que não percebi que a questão não era o que eu fiz ou deixei de fazer e, sim, a tua total incapacidade de dar e receber amor e, também, de traduzi-lo.
Ainda recordo-me da tua indagação, quando lendo um texto meu, perguntaste: quem é o destinatário? E, eu, estupefata, respondi:

- “No meu olhar estava escrito, só tu não leste.
Em minhas mãos paradas, inertes, estavam acorrentados o desejo e a vontade de ser tua. Só tu não viste.
No meu coração palpitante, pulsava um velho e um jovem amor... Só tu não notaste.
E agora buscas nas minhas palavras o destinatário desse amor. Que tolo amor esse meu, que até hoje, tu não entendeste!”

É, meu amigo, continuas a não entender, mas agora eu rompo o silêncio e digo-te, realmente: o nosso tempo passou... A casa da esperança não faz mais sentido, pois, quem ama, cuida! Não abre espaços, nem deixa a porta entreaberta...
Adeus!

8 comentários:

chica disse...

Que triste carta, Julieta e que triste despedida.

Não te despeças do blog..

Sempre há a falar por aqui...Um beijo,fica bem ,tudo de bom,chica

Ayanne Sobral disse...

Fez silêncio aqui. Seu texto me emudeceu.

Suas palavras pousadas sobre a tela me silenciaram por motivos que não cabem no conceito das palavras e extrapolam a grafia porque pertencem a algo que não sei dar nome.

Que lindo. E obrigada por escrever.

PS: Se despedindo do blog?!!
Boa sorte.
Continue brincando com as palavras, você faz isso com maestria.

Juliana Almeida disse...

Desabafo.

O amor é algo mesmo traiçoeiro... desperta o melhor e (às vezes) o pior de nós mesmos. Faz com que, por vaidade, decepção, expectativas e tantos outros sentimentos que não cabem em si, nós nos confundamos em relação à direção do amor: Ele é sempre "para fora" e só assim se torno nosso, e com sorte, do outro.

E quando esse outro não o alcança, ficamos assim, com essa sensação de que tudo foi em vão.Mas não foi.

Tem uma canção que diz que "só é seu aquilo que você dá". E você deu, Ju. A mim, a ele e a todas e todos que seguem as suas palavras cheias de doçura e de um amor puro, genuíno, cristalino e lírico.

Por isso, não nos abandone.Quiçá, "abandone" o destinatário que insiste em fingir que não entende.

Continue o seu caminho, reconstrua, crie novos. O mundo precisa de poesia.
Um bjo carinhoso da sua filha.

manu disse...

Há quem viva a cegueira e surdez permanente do coração. Há quem não saiba interpretar sinais subtis ou até mesmo os evidentes. Há quem nunca descubra o que é o amor e as mais profundas e belas maneiras de o demonstrar. Para essas pessoas o amor é coisa distante, esperam que, qual pedaço de papel seja apenas e só isso um papel e são incapazes de ler nas entrelinhas.Para esses o tempo que se gasta a sonhar com respostas,que nunca chegarão,causa frustação pelo desentendimento e insensibilidade de se poder enxergar do que está para além duma follha de papel. Para quem ama, não são precisas coisas palpávéis, basta que por momentos vejam o brilho de um olhar.
Reconstruiste um caminho, da forma mais bonita que conheci. Acabou esta obra, mas fico a aguardar ansiosa por um novo recomeço em que não hajam remendos e saudades, apenas momentos, muitos momentos de felicidade, mesmo que seja feita de pequenas coisas porque é com elas que se constróiem as grandes vidas.
Beijo enorme
Manu

Unknown disse...

Excelente narrativa, belo pedaço de prosa que, em silêncio, nos preenche ... a ausência...

Carla S.M. disse...

JuLiêta!!!! Carta tão bela e cheia de uma tristeza que, querida, além de tua é de toda a humanidade... uma esperança costurada de mágoa, saudade, negligencias mil... e a constatação inevitável da solidão do pensamento não comungado.
Mas, não. Não deixe de escrever de, para e com amor. Insista em viver através das palavras... seja o medo, a incerteza ou o que for. Construa e reconstrua ainda e sempre.

Beijos!!!!!!!!!!!

Libel disse...

Oi Julieta,
Agora fiquei assim "Ô" com boquinha de peixe, sempre entendi o amor como um sentimento universal, um sentimento infinito, sem começo e sem fim, um sentimento que faz parte do nosso coração, que não se despede, que bombeia, mais lento, menos lento, mas sempre se renova, sempre nos diz: Estou aqui!!...
Enfim...O Amor é aquele sentimento que não merece um Adeus, mas sim um: Obrigado.

Não entendo essas cartas de despedida, essas últimas cartas, mas compreendo e até recomendo quando servem para desligar do filme antigo, recomeçando outro, com novos personagens, alguma acção, comédia, empolgação e romance.

Julieta, o Amor continua dentro de ti a pulsar, esse Amor está aqui nesse blog, está aqui connosco, pela forma como escreves, pela tua maneira de ser, pela pessoa linda que és, pela poesia em palavras que nos ofereces, pela tranquilidade que nos passas, pela riqueza de teus pensamentos, pela grandeza de sentimentos.
Por isso, não adianta dizer ADEUS, porque o AMOR acaba num lugar, mas recomeça do outro, e nós estamos aqui para provar isso, porque simplesmente: TE AMAMOS!!...

Beijos amiga..
Inté...

lis disse...

Oi Juliêta
Saudade de voce e dos seus escritos, suas cartas de amores e desamores.
Nao aceito despedidas intepestivas rsrs
Quando quiser volte e nos deixe poemas de amor a natureza, a alegria a esperança , enfim a todos os motivos que sempre te inspirou.
Te espero porque sei que é guerreira e poeta.
um grande abraço