A minha memória é uma sala de espera cheia de significados. Nela, os baús emocionais acumulam-se.
São lembranças de uma época em que muita gente habitava dentro e fora de mim: as famílias, suas casas, seus quintais e suas histórias que se confundiam com a minha. Tudo era matéria de troco: afeto, ternura, carinho e um pouco de açúcar para adoçar a vida nos momentos de dificuldades. Havia no ar palavras e ações que se somavam ao gesto de viver: amizade, solidariedade, fraternidade...
Na arquitetura do tempo, eu desembrulho as minhas lembranças alinhavando-as em retalhos de saudades, enquanto os meus pés andarilhos caminham devagar, sem pressa, arranhando silêncios na tentativa de entender mudanças... Retiro das pausas das fotografias a alegria genuína de uma época feliz, mas sinto-me como uma ladra das horas, tentando usurpar uma felicidade com prazo de validade vencida...
Ainda assim, em minha sala de espera, as imagens em sépia se sucedem lembrando o passado. Perco-me nessa paisagem de lembranças, recordando famílias, amigos, amores, sonhos e projetos.
Havia, sim, muita gente dentro e ao redor de mim, lembrando-me que a felicidade é um sopro, um vento manso, às vezes imperceptível e que é preciso saber valorizá-la nos pequenos gestos do cotidiano.
Diziam-me: “Não a deixe fugir, não a procure longe de si. É dentro de você que ela cochila. Desperte-a!”
Deixo a sala, troco de pele, de imagens, de paisagens e venho para o presente...
Questiono o tempo, provoco, mas não encontro o quê comemorar. Apenas, um mundo novo, moderno, cheio de conquistas que estampam páginas de jornais e revistas, mas que não é suficiente para preencher vazios existenciais e dá uma resignificação para essa vida, breve e louca.
A ciência e a tecnologia deram um passo incomensurável em relação ao passado, mas nunca tanta gente se sentiu tão só, sem esperança e infeliz. O moço da carrocinha que antes entregava, em casa, pão e leite fresquinhos, hoje, entrega drogas e outras substâncias, delivery.
Embriagamo-nos de modernidade até nas relações afetivas... O que antes era para sempre, hoje, será eterno enquanto dure... O amor deixou no passado o “nós” para ser conjugado na primeira pessoa. Só o “eu” importa. Pedimos amor, mas não sabemos dá-lo. Vivemos uma solidão a dois, em casamentos de fachada, de conveniência, de interesse, onde nome e sobrenome de família e suas fortunas, contam mais que uma relação de amor, carinho, respeito e tolerância.
Corremos atrás de uma felicidade que há muito cochila dentro de nós e não percebemos, pois estamos ocupados demais em mostrar aos outros, o quanto temos de dinheiro, sucesso e poder.
E, nessa arquitetura do tempo, onde o ter vale mais que o ser, vamos deixando a vida nos levar de roldão, atropelando sentimentos, fumando vazios e bebendo solidão.
São lembranças de uma época em que muita gente habitava dentro e fora de mim: as famílias, suas casas, seus quintais e suas histórias que se confundiam com a minha. Tudo era matéria de troco: afeto, ternura, carinho e um pouco de açúcar para adoçar a vida nos momentos de dificuldades. Havia no ar palavras e ações que se somavam ao gesto de viver: amizade, solidariedade, fraternidade...
Na arquitetura do tempo, eu desembrulho as minhas lembranças alinhavando-as em retalhos de saudades, enquanto os meus pés andarilhos caminham devagar, sem pressa, arranhando silêncios na tentativa de entender mudanças... Retiro das pausas das fotografias a alegria genuína de uma época feliz, mas sinto-me como uma ladra das horas, tentando usurpar uma felicidade com prazo de validade vencida...
Ainda assim, em minha sala de espera, as imagens em sépia se sucedem lembrando o passado. Perco-me nessa paisagem de lembranças, recordando famílias, amigos, amores, sonhos e projetos.
Havia, sim, muita gente dentro e ao redor de mim, lembrando-me que a felicidade é um sopro, um vento manso, às vezes imperceptível e que é preciso saber valorizá-la nos pequenos gestos do cotidiano.
Diziam-me: “Não a deixe fugir, não a procure longe de si. É dentro de você que ela cochila. Desperte-a!”
Deixo a sala, troco de pele, de imagens, de paisagens e venho para o presente...
Questiono o tempo, provoco, mas não encontro o quê comemorar. Apenas, um mundo novo, moderno, cheio de conquistas que estampam páginas de jornais e revistas, mas que não é suficiente para preencher vazios existenciais e dá uma resignificação para essa vida, breve e louca.
A ciência e a tecnologia deram um passo incomensurável em relação ao passado, mas nunca tanta gente se sentiu tão só, sem esperança e infeliz. O moço da carrocinha que antes entregava, em casa, pão e leite fresquinhos, hoje, entrega drogas e outras substâncias, delivery.
Embriagamo-nos de modernidade até nas relações afetivas... O que antes era para sempre, hoje, será eterno enquanto dure... O amor deixou no passado o “nós” para ser conjugado na primeira pessoa. Só o “eu” importa. Pedimos amor, mas não sabemos dá-lo. Vivemos uma solidão a dois, em casamentos de fachada, de conveniência, de interesse, onde nome e sobrenome de família e suas fortunas, contam mais que uma relação de amor, carinho, respeito e tolerância.
Corremos atrás de uma felicidade que há muito cochila dentro de nós e não percebemos, pois estamos ocupados demais em mostrar aos outros, o quanto temos de dinheiro, sucesso e poder.
E, nessa arquitetura do tempo, onde o ter vale mais que o ser, vamos deixando a vida nos levar de roldão, atropelando sentimentos, fumando vazios e bebendo solidão.
8 comentários:
Boa tarde,
adorei o seu texto, revela aqui um Ser com uma grandiosidade e sensibilidade intocáveis.
Beijinho,
Ana Martins
Amiga, por essas e outras que é bom construirmos um mundo nosso, que viva dentro do outro, mas que não se influencia. Um mundo onde governamos e decidimos, mesmo que a decisão seja ser feliz a qualquer custo. Voc~e sempre dando um baile nas palavras! Muito bem escrito. Um grande beijo!
Isto é... RECONSTRUINDO CAMINHOS. Vou escrever com a liberdade que sei possuir, neste cantinho. Sei.
Gostava de ter sido eu a inventar a expressão "Ladra das Horas"... mas cheguei tarde, inventaste-a primeiro...
O tempo... aquele tempo que te dediquei sobre a forma de uma ampulheta... é mesmo construindo sobre tijolos de solidão. Nascemos sós... morremos sós. Nada trazemos, nada levamos. Dos três tempos que nos ensinaram existir, o passado já morreu, o futuro ainda não chegou e o presente... ah, o presente é desperdiçado muitas vezes a recordar o passado ou a projectar o futuro....
Será verdade que só os ignorantes podem ser felizes, no sentido de não se questionarem sobre nada, de aceitarem todas as respostas como um facto... e não como novas questões?
Será verdade que pensar dói?
Será verdade que nada somos uns sem os outros... e que o simples facto de eu ter lido este teu texto... já faz de mim uma pessoa melhor, por me rever nele?
Sim... acredito mesmo - tal como dizes - que muita gente habita dentro e fora de mim. E de todas essas presenças... cabe a cada um de nós escolher o que deve permanecer e o que deve desaparecer, o que é de valor e o que é desperdício, o que é sabedoria e o que é ruido. Vivemos num mundo de ruido, não te parece?
Um ruido que nos distrai, que abafa a tal felicidade interior, que nos manieta os sentidos e corta a inspiração.
Precisamos de lufadas de ar fresco, precisamos de pessoas que sejam o ar fresco, precisamos de lhes respirar o ar e as ideias, as palavras e o exemplos, precisamos de ideais... oh, como precisamos de ideais.
Sei que não te importas com o tamanho kilométrico do comentário, poderia escrever muito mais sobre o que li, mas ... só desejo que sejas sempre uma "ladra das horas", repescando memórias sépia e divagando com lucidez sobre a insanidade que nos apaga e amordaça.
Beijos,
Rolando
O tempo é madastro para quem vive de saudades, tira-nos o que gostávamos de ter e ser e molda-nos a seu belo prazer, indiferente aos designios do nosso coração.
E nesta caminhada insane onde o tempo é rei e senhor vamos aproveitando os restos de um tempo que foi e sobrvivendo ao momento que temos.
Beijo enorme
Manu
Dona Juliêta, como é emocionante entrar aqui, "sentar" e ler seus textos.
Poxa, realmente são dignos de passarem do virtual para o papel. É tão leve e tocante, que chega a nos comover!
Parabéns, minha linda!
PS.: Como conversamos ontem, a minha coluna é: www.maisacao.net/maisacao-hot.php.
Beijos.
Juliêta amada...
escreves lindamente, mas isso eu já disse muitas vezes...
também tenho a memória dos afetos e de outros tempos... sei da modernidade, e mais ainda da solidão... mas juro que ainda acredito em amores para sempre, sejam eles quais forem, acredito também em relações bonitas entre gente boa, em um pedaço de bolo que faço e levo embrulhado no alumínio para uma amiga... é meu jeito de ser como o moço do carrocinha com o leite e o pão...
e assim a gente vai fazendo instantes de felicidade, aqui e ali... pequenos, mais grandes em significados.
adoro você, e um dia quero te levar um pedaço de bolo no alumínio, viu ?!?!
carinho enorme
Oi Juliêta
Arquitetura ... já nos remete a ambientes frios que com nossos sentimentos transformamos em salas quartos varandas aconchegos coloridos.
o tempo- sempre me irrita pensar no tempo rs esse que nos rouba a juventude e nos faz mais amargos e conscientes, responsáveis!
como gostaria de ser um tantinho irresponsável rs as vezes e se acontece me culpo e peço desculpas ... quanta tolice né?
Ah as imagens em sépia poderosas e me deixando sempre em processo lento de nostalgia.
e como voce descreve bem toda essa alternância de valores , a afetividade perdida ou mascarada.
E pra todos tão normais !
Ah Ju seu texto me conforta só numa coisinha - a solidão , o silêncio vivenciado esses dias de introspcção tem sido bons de beber.
Vou me afogar rsrs
Ainda não é retorno a vida normal, continuo em Vitória , redescobrindo
sensaçoes , mergulhada as vezes em alguma culpa ( ?) referente a perdas ao longo do meu tempo vivido aqui nesse apto, nessa cidade.
Volto logo.
deixo abraços e agradeço seu carinho.
te gosto muito
A humanidade nunca esteve tão vazia de ideais como hoje. A tecnologia não preenche o vazio existencial, ao contrário, é a causa...
O homem esquecendo-se de Deus e se achando auto-suficiente aumenta cada vez mais o seu vazio. Por outro lado viver de lembranças é não aperfeiçoar-se na arte de viver, e, viver é amar o presente, pois o passado já está perdoado em suas imperfeições.
Beijo no coração,
Carlos
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