Vendo-me triste, alguém pergunta:
- O que te faz feliz?
Sem titubear, respondo-lhe que receber e enviar cartas de
amor, escritas à mão, devolve-me o sorriso. Surpreendido com o inusitado da
resposta, indaga-me:
- Por quê? E, eu lhe digo:
Porque ao abri-las sinto o perfume da felicidade e quando escrevo,
nenhuma parte de mim se esgueira por entre os parágrafos. Ali, sou eu nua; amando
sem máscaras e sem medo de ser feliz.
No acervo pessoal das minhas melhores lembranças, há sempre um
carteiro e uma caixa de correio abastecendo-me de sorrisos e de sonhos. E, na
memória afetiva, ecos de um tempo que ainda ressoa em mim lembrando-me de uma
jovem que era feliz por que amava, era amada e sentia desejo de partilhar esse
afeto com toda a humanidade.
Na construção da narrativa, daquela época, o amor era a
coisa mais importante. Ele era o fio condutor para uma vida plena e feliz. Tudo
o mais era valor agregado; necessário, mas não indispensável. Não havia excessos, tampouco prazos de
validade.
Porém, hoje, quando os arautos da má notícia anunciam o ‘fim
do mundo’ para o dia 21 de dezembro, do corrente ano, preocupo-me com
proximidade da data e resolvo fazer um inventário dos meus bens, para melhor
aproveitar o tempo que me resta. Perdida nos pensamentos chego à conclusão de
que dará excesso de bagagem, se eu resolver levar o que acumulei durante décadas, pensando que tudo
aquilo era a felicidade: casas, carros, títulos de clube, celulares, notebook,
roupas de marca, aplicações e algumas quinquilharias... Lembranças das viagens
que fiz.
Perplexa, constato que nada daquilo caberá no meu caixão - ele
não tem gavetas - nem nos sete palmos de terra destinados a mim, quando chegar
à derradeira hora.
Entre surpresa e aliviada por não carregar mais nenhum peso,
decido que já é hora de despojar-me também, das vaidades, das ambições, do
orgulho, dos rancores e mágoas que alimentaram a minha alma nessa breve
passagem pela vida. E agora, que me encontro livre, leve, solta e sem nenhuma
carga, sinto-me triste. E, essa tristeza que você vê no meu olhar empanando-lhe
o brilho, é pelas pessoas que ainda valorizam coisas que as traças e a ferrugem
vão destruir, pois, nesse exato momento, quando penso em felicidade, só me vem
à mente aquela época em que a alegria corria solta pelos meus olhos. Por isso, volto
à sua pergunta:
- O que te faz feliz? E, reafirmo.
Sinto-me feliz quando
abro as cortinas do passado e uma saudade imensa invade-me de tal forma, que eu
roubo uma fatia do tempo e percebo que ali, naquele antigo cenário; composto
por um carteiro, uma caixa de correio e pelos bordados da minha imaginação está
a melhor parte de mim... A mais feliz! Sem
excessos e sem bagagem.
2 comentários:
Lindo! :)
Lindo como sempre... tocante como nunca! Quem dera eu Dona Juju, me livra do orgulho, da vaidade e continuar no caminho. Sempre aprendendo, sem sua presença, mas com suas palavras. Beijos... Rafa.
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