As folhas da memória farfalham, numa dança festiva, obrigando-me a abrir o baú das minhas saudades esquecidas. Lembranças e sentimentos guardados pedem alforria e deixam para trás o rascunho dos pensamentos. Hoje, eu vou falar sobre os quintais da minha infância.
Um olhar de espanto me sobrevém, nesse momento, quando constato que passaram-se muitos anos, todavia as recordações ainda têm o frescor dos tempos idos. O verde, esperança que abrigou-se sob o teto das minhas memórias, exala agora o perfume das goiabeiras.
Os quintais de dona Judite, de dona Nenê e de dona Ziza eram o meu lugar no mundo. Três recantos mágicos onde eram saciadas a fome de alegria e de felicidade. Elas tinham um zelo incomum pelos seus pomares e a vigília era constante. O que me deixava triste! Porque, na maioria das vezes, eu só podia usufruir desse ambiente por meio do olhar e da contemplação.
Imagine o meu suplício! Entrar no reino encantado da “fantasia comestível” e não poder exercer o livre arbítrio da gula. As minhas mãos comichavam de vontade de tocar, de sentir a textura daquela fruta tão bela e apetitosa. E a boca tinha um desejo premente de provar o fruto proibido.
Às vezes, eu encontrava algumas goiabas envolta em um pano e ouvia a explicação de que isso as protegia dos insetos. Pense numa frustração! E, também, na vergonha! Além de não poder tocá-las, algo me impedia de acariciá-las com o olhar naquele momento. Este fato só aumentava a minha culpa, pois na inocência da idade intuía que o inseto era eu. Que a ânsia que tinha pela fruta estava escrita nos meus olhos. Por isso, a vigília das proprietárias dos sítios e a vergonha de ver as minhas reais intenções descobertas.
Foram anos de observação e sofrimento. Nas raras ocasiões em que me foi permitido saborear aquela fruta, não saciei nem a fome, nem o desejo. Queria um pé de goiaba para chamar de meu...
Revendo agora essas lembranças eu chego à conclusão de que além do gosto pelo fruto da goiabeira, o que mais me encantava era a cor verde das suas folhas e frutos banhados pelas gotas de orvalho da madrugada. Um espetáculo que trazia brilho aos meus olhos e me remetia à esperança, à alegria e à felicidade.
Um comentário:
Tão lindos jardins povoam tuas recordações.Eram mesmo lindos e os guardamos dentro de nós! Adorei! beijos, tudo de bom,chica
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